Por que o mundo não vive sem café? O que a ciência já sabe e o que é dúvida no impacto da bebida na humanidade

  • 08/10/2025
(Foto: Reprodução)
Preço do café deve cair até o fim do ano, mas em ritmo lento; entenda Mais um cafezinho? ☕ Seja no copo térmico a caminho do trabalho, na pausa do meio da tarde ou naquela dose dupla de espresso depois do almoço, o café se tornou praticamente indispensável na rotina de milhões de brasileiros e bilhões de pessoas ao redor do mundo. A importância da bebida ficou tão evidente que chegou ao centro da diplomacia internacional: em uma conversa recente entre Lula e Donald Trump, o café brasileiro entrou na pauta. Segundo a BBC News Brasil, o presidente americano comentou que os Estados Unidos estão “sentindo falta” dos produtos brasileiros afetados pela tarifa de 50%, citando especificamente o café. E essa dependência americana não é exagero: os Estados Unidos não produzem café em escala comercial e dependem das importações para atender a uma demanda que movimenta bilhões de xícaras por dia no mundo. O Brasil, maior produtor global e responsável por quase metade da oferta de arábica, é peça central nesse abastecimento. Mas, do ponto de vista da Ciência, o que explica o fato de o café ter se tornado tão essencial, capaz de atravessar fronteiras, influenciar economias e até a diplomacia? 🧠As pistas estão no cérebro e nos mecanismos neurobiológicos que os pesquisadores começam a desvendar. Abaixo, entenda mais. Café em grãos. Pixabay/Pexels Circuitos de prazer e recompensa Em números, a escala impressiona: o planeta bebe algo perto de 2,5 bilhões de xícaras por dia. Segundo a Organização Internacional do Café (OIC), o consumo mundial do gão ultrapassa 177 milhões de sacas de 60 kg por ano, o que equivale a cerca de 485 mil sacas diariamente. Só nos Estados Unidos, 66% dos adultos bebem café diariamente, um aumento de 7% desde 2020, conforme dados da National Coffee Association (NCA). E o que sustenta esse apetite global é, antes de tudo, neurobiologia aplicada ao cotidiano: uma combinação de prazer aprendido, estado de alerta prolongado e foco intensificado. A explicação começa por uma peça-chave do nosso relógio interno: a adenosina. Quando ela se acumula, o corpo entende que é hora de desacelerar. ⏱️ENTENDA: a adenosina é uma molécula que participa da produção de energia ao formar compostos como o ATP, usados pelas células para realizar suas atividades. Além disso, atua como uma mensageira química, regulando processos como o sono, o fluxo sanguíneo e o funcionamento do cérebro. A cafeína, por sua vez, é um “impostor” elegante. Ela tem uma estrutura molecular parecida com a da adenosina e consegue se encaixar nos mesmos receptores. Só que, ao fazer isso, bloqueia o sinal de cansaço sem realmente repor a energia gasta. ⛽O resultado é uma falsa sensação de disposição: o cérebro acredita que ainda há "combustível", quando na verdade está apenas com o freio desligado. É esse truque bioquímico que explica por que uma xícara de café desperta tanto, mesmo depois de um dia exaustivo. “A ligação da cafeína com os receptores de adenosina melhora a nossa vigília porque diminui a sinalização de cansaço”, explica Antonio Herbert Lancha Junior, doutor em Nutrição e professor da Universidade de São Paulo (USP). E é justamente por isso que conseguimos ficar acordados por mais tempo, mas com um preço: quando o sono finalmente chega, ele já não tem a mesma qualidade. “A pessoa dorme, mas não tem o descanso compatível”, explica Lancha Junior. Como a cafeína age no cérebro Wagner Magalhães/Arte g1 Estudos com eletroencefalograma (EEG) mostram que a cafeína chega a mudar o ritmo das ondas cerebrais. Ela reduz o padrão mais lento e relaxado, típico de quando estamos sonolentos, e favorece um estado de alerta maior. ⚡Na prática, isso significa que o cérebro fica mais atento a estímulos: a visão parece mais nítida, o raciocínio acelera e a capacidade de processar informações aumenta. Um estudo publicado na revista "JAMA Network Open" observou que até pequenas doses, entre 40 e 200 miligramas de cafeína - o equivalente a uma ou duas xícaras de café - já bastam para gerar efeitos perceptíveis. Os voluntários relataram menos fadiga, maior disposição e responderam mais rapidamente a tarefas que exigiam atenção e coordenação. Em testes de longo prazo, o desempenho também melhorou: a cafeína ajudou a manter a concentração por períodos mais extensos, algo especialmente útil para quem precisa estudar, dirigir ou trabalhar por horas seguidas. ⏰É por isso que tanta gente sente que “só funciona” depois daquele clássico café da manhã. O cérebro, ainda em ritmo de descanso, recebe um empurrão químico que engana o sistema de fadiga e o coloca em modo ativo. Já a cafeína, por si só, não ativa diretamente o centro de recompensa do cérebro. Essa relação só aparece quando o consumo está ligado justamente ao prazer, por exemplo, quando a pessoa sente satisfação ao tomar café. Nesse caso, o prazer é aprendido e associado ao hábito, mas a cafeína em si não estimula o sistema de recompensa da mesma forma que substâncias como a glicose. Estímulo químico ou ritual social? Estudos recentes mostram que o café ativa no cérebro os mesmos circuitos de prazer envolvidos em outros comportamentos reforçadores, como ouvir música, fazer exercícios ou comer algo de que se gosta. Essa ativação ocorre porque a cafeína estimula, de forma sutil, as vias dopaminérgicas, regiões responsáveis por sensações de bem-estar e motivação. 🧠 ENTENDA: as vias dopaminérgicas são como estradas dentro do cérebro que transportam a dopamina, uma substância ligada ao prazer, ao movimento e ao humor. Dopamina: por que busca desenfreada por estímulos pode tirar satisfação da vida Mas o que mantém o hábito vai além da química. O ato de tomar café é também um comportamento moldado por contexto. Segundo Manuela Dolinsky, nutricionista e presidente do Conselho Federal de Nutrição, o café carrega uma dimensão simbólica que o torna parte da vida social. “Tomar café é quase sempre um comportamento situado: envolve o horário do dia, as pausas do trabalho, a interação social, o aroma, a temperatura e até o som da xícara”, explica. E esses estímulos sensoriais e sociais criam uma experiência prazerosa que o cérebro aprende a associar a momentos de foco, descanso ou conexão: mesmo quando o efeito da cafeína já não é tão perceptível. Dolinsky destaca ainda que, do ponto de vista neurobiológico, a cafeína promove pequenas ativações funcionais nas vias dopaminérgicas, tornando experiências de desempenho mais agradáveis e reforçadoras. Por sua vez, esse mecanismo cria um componente de reforço positivo que favorece a repetição do comportamento. “A interação entre adenosina e dopamina faz com que os circuitos de motivação e recompensa também sejam modulados, aumentando a disposição para estudar, trabalhar ou treinar logo após o primeiro café”, resume. Xícara de café com leite. Adobe Stock LEIA TAMBÉM: Moedor de café: g1 testa 5 modelos elétricos Qual cafeteira espresso escolher: com cápsulas, café moído ou em grãos? Britânico morre de overdose de cafeína após consumir o equivalente a 200 doses de café O que a ciência ainda não sabe? Octavio Marques Pontes Neto, neurologista e professor da USP de Ribeirão Preto, explica que o café é muito mais do que uma bebida estimulante. “Ele contém centenas de compostos bioativos e desperta respostas sensoriais complexas: o aroma, o sabor, o calor e até lembranças associadas ao ritual de prepará-lo e tomá-lo”, afirma. Apesar disso, o pesquisador reconhece que a ciência ainda está longe de compreender totalmente como esses elementos se conectam. Há décadas, estudos epidemiológicos associam o consumo regular de café a um menor risco de depressão e de doença de Parkinson, possivelmente por mecanismos ligados à ação da cafeína sobre os neurônios dopaminérgicos e aos efeitos antioxidantes e anti-inflamatórios de seus compostos. Mas essas correlações ainda carecem de uma explicação causal convincente. Pontes Neto aponta ainda que faltam estudos que explorem a interação entre o efeito farmacológico da cafeína e os aspectos sensoriais e emocionais do consumo. Embora o tema já tenha sido amplamente estudado, o pesquisador reconhece que ainda há mais dúvidas do que certezas. “A ciência ainda sabe pouco sobre como esses fatores sensoriais interagem com a ação farmacológica da cafeína”, afirma. Segundo ele, compreender essa relação exige separar o que vem do composto químico do que vem da experiência sensorial. Entre as principais lacunas de pesquisa estão como distinguir o efeito da expectativa e do prazer sensorial do efeito real da cafeína, de que forma o cheiro e o sabor ativam áreas cerebrais ligadas à recompensa e ao estado de alerta, e se o próprio ritual de tomar café já provoca respostas condicionadas de vigília e motivação. LEIA TAMBÉM: Como tomar café pode fazer bem à saúde Forma de preparo do café pode tornar bebida prejudicial para quem tem colesterol alto; entenda o cafestol Uma xícara de café pode ser boa para você; entenda Xícara de café mais cara do mundo custa mais de R$ 3,6 mil e entra no Guinness

FONTE: https://g1.globo.com/ciencia/noticia/2025/10/08/o-que-a-ciencia-ja-sabe-e-o-que-e-duvida-no-impacto-da-bebida-na-humanidade.ghtml


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